O perigo das falácias

Postado por: Mentalista
Data: 2016-08-26 21:59:04 (Atualizado em: 2023-08-31 21:21:09)

Tags: blog, artigos, jw.org

No seu livro In Two Minds: The Dilemma of Doubt and How to Resolve It, Guiness discute sobre as principais razões pelas quais as pessoas, incluindo os próprios cristãos, possuem dúvidas sobre o cristianismo: dúvidas vêm de visões equivocadas de Deus; dúvidas vêm de fundações intelectuais fracas; dúvidas vêm de uma falta de compromisso; dúvidas vêm de uma falta de crescimento; dúvidas vêm de emoções incontroladas; dúvidas vêm do medo de acreditar; dúvidas vêm de questionamentos insistentes; e dúvidas vêm da impaciência ou da desistência.

A lista de razões para duvidar acima poderia facilmente ser revertida: crenças vêm da necessidade de ser grato a alguém; crenças vêm da necessidade de um Deus; crenças vêm de fundações intelectuais fracas; crenças vêm da necessidade de estar comprometido com algo; crenças vêm de esperanças no crescimento pessoal; acreditam por causa de emoções incontroladas; acreditam por causa do medo de duvidar; acreditam por não questionarem o suficiente; e crenças que vêm de desistências muito precoces.

Isso mostra claramente como o medo de questionamentos pode evitar uma análise séria do assunto. Esta, no entanto, requer que se evite afirmações falaciosas. Vamos, primeiro, relembrar algumas delas. Mostrar essas falácias obviamente não refuta automaticamente as crenças envolvidas, mas, pelo menos, demonstra que não são argumentos realmente lógicos.

FALÁCIAS LÓGICAS

Raciocínio circular: Trata-se simplesmente de afirmar a mesma coisa com outras palavras. Por exemplo:

"Eu acho que alpinismo é um esporte perigoso porque é inseguro e arriscado." (Motivo: Não se explica o motivo; apenas repete-se que é perigoso.)

"Por que eu sou a pessoa mais indicada para o trabalho? Porque eu descobri que, dentre todos os outros candidatos, e considerando minhas qualificações, eu sou a melhor pessoa para o trabalho."

Egocentrismo ideológico: Trata-se da incapacidade ou recusa sistemática em se pôr de um ponto neutro para analisar alguma coisa. Geralmente envolve recorrer-se à mesma autoridade que está sendo questionada. Por exemplo:  

"Por que o Papa, em questões doutrinárias, é infalível? Porque o Concílio de…, sob a inspiração da Assistência Extraordinária do Espírito Santo dada ao líder da Igreja, que o promulgou,  declarou assim." 

Supersimplificação: Dizemos que há supersimplificação quando isso é feito de tal forma que muitos detalhes importantes são deixados de lado e o resumo feito só permite uma única conclusão. Por exemplo:

"A Bíblia alega ser a Palavra de Deus e sem erros. Se você achar um erro nela, então ela tem de estar totalmente errada." (Motivo: Poderia haver algo certo nela, mas o argumento nega totalmente a possibilidade.)

Generalização apressada: É tirar uma conclusão com base em evidências insuficientes, passar por cima de detalhes, fatores, circunstâncias e mesmo dos casos que poderiam refutar a universalidade de suas premissas. Frequentemente são generalizações feitas com base num único episódio particular, ignorando as diversas nuances que ele possa ter e aplicando suas características a todo um grupo de pessoas ou doutrinas. Devemos ter cuidado com elas, são falácias que podem simplesmente passar despercebidas por anos. Por exemplo:

"Minha avó tem dor de cabeça crônica. Meu vizinho também tem e descobriu que o motivo é um câncer. Logo, minha avó tem câncer."

"Nas duas vezes em que fui assaltado, os bandidos eram negros. Bem que minha mãe fala que todo negro tem tendência para ladrão!"

"O pastor da igreja X roubou o dinheiro dos fiéis. Fulano é pastor. Logo, também é ladrão."

"Meu tio é candomblecista e já matou um bode para oferecer ao orixá. Beltrano foi ao terreiro de candomblé. Logo, ele também mata animais para o orixá."

Ataque pessoal: Consiste simplesmente em atacar uma pessoa em vez dos argumentos que ela expõe, usar um traço de seu caráter como pretexto para desqualificar ou ignorar o que ela diz. Pode ser usado quando não se sabe como refutar o que o oponente diz ou simplesmente por excesso de preconceito, sendo um meio muito cômodo (e desonesto) de fugir do debate.

Além disso, a melhor forma de se manter o controle sobre um grupo é justamente fazer com que ele evite qualquer contato com informações ou opiniões dissidentes. Não é por outra razão que uma das primeiras medidas de regimes políticos ilegítimos é a censura e perseguição a seus críticos e dissidentes.

Religiosamente falando, isso é feito pela difamação de ex-membros, especialmente se eles tentam explicar as razões por que deixaram o grupo religioso a que pertenciam. Em vários casos, generalizações excessivas, termos pejorativos e mesmo a proibição de qualquer contato são usados para se criar a ideia de que todos os ex-membros têm falhas de caráter, ignorando a possibilidade de abandono por razões de consciência, discordância doutrinária e toda uma série de fatores que podem levar alguém a reavaliar honestamente suas crenças. Assim, abafa-se na fonte a possibilidade de um debate ou questionamento por parte dos que ficaram, já que eles serão desencorajados a procurar entender os motivos dos dissidentes.

Exemplos:

"O senhor não tem autoridade para criticar nossa política educacional, pois nunca concluiu uma faculdade."
"Beltrano não entende nada de espiritualidade, ele é gay."
"A religião é uma coisa má. Veja só quantas guerras foram provocadas por ela."
"Não deem ouvidos ao que ele diz. Como ele abandonou nossa fé, as críticas dele à nossa organização só podem ser mentiras."
"Você diz que o cigarro é um vício horrível, mas ainda não conseguiu parar. Por que eu deveria lhe dar ouvidos, então?"

Apelo à ignorância: Consiste em usar a falta de provas (ou a inabilidade do oponente em apresentá-las) a favor ou contra algo para provar uma outra tese. Acontece que a mera falta de provas não prova nada. No máximo, pode sugerir, mas nunca fechar questão. Exemplos:

"Você não tem provas de que Deus existe. Logo, ele não existe."
"Você não tem provas de que Deus não existe. Logo, ele existe."
"É claro que houve um dilúvio; ninguém nunca conseguiu provar que não houve."

Apelo à multidão: A questão essencial aqui é que quantidade não é critério da verdade. O que esse tipo de falácia faz é desviar a atenção do tema tratado para um outro, aparentemente importante, mas que é um tópico à parte. O fato de tantas pessoas acreditarem em algo não significa que seja verdade. Por exemplo, há poucos séculos, acreditava-se que o oceano era repleto de monstros que inviabilizariam viagens transatlânticas, e hoje podemos viajar em cruzeiros ao redor do mundo com uma boa margem de segurança. Em religião, especificamente, é algo ainda pior: se dez milhões acreditam numa coisa, uns 300 milhões acreditam em outra bastante diferente; e mesmo a religião mais significativa numericamente não tem uma vantagem tão grande, pois a soma das outras é ainda superior ao número de fiéis dela. Existem formas mais inteligentes e honestas de se buscar o consenso do interlocutor e da audiência. Exemplos:

"Dez milhões de pessoas não podem estar erradas. Junte-se à nossa igreja você também."
"Você não acha que se uma religião cresce tanto em tão pouco tempo é porque Deus está com ela?"

Apelo ao medo: Quando alguém usa esse tipo de argumentação, está na realidade dizendo que, se uma ideia ou concepção nos assusta, então é melhor crer que ela é verdade, mesmo que não haja uma razão lógica para demonstrá-la. É fácil mostrar o absurdo disso, bastando mudar o motivo do medo:

"Eu acredito que o bicho-papão mora no armário, você não acredita. Se eu estiver errado, não terei perdido nada. Mas já parou para pensar que, se eu estiver certo e você errado, ele pode devorar você?"

"É melhor você votar pela condenação do réu ou você pode ser a próxima vítima dele."

Apelo à autoridade: O bom senso exige que, antes de nos curvarmos a títulos e fama, procuremos saber que argumentos estão sendo usados e se eles realmente merecem crédito. Afinal, mesmo os sábios têm suas falhas e equívocos.

Eufemismos: São palavras que designam coisas potencialmente desagradáveis de forma mais suave. Se eles são usados com muita frequência, pode ser o caso de que nosso interlocutor esteja tentando minimizar ou disfarçar alguma coisa. Exemplos:

"Apropriar-se ilicitamente de dinheiro público." (Roubar dinheiro público.)
"Ser convidado a retirar-se do recinto." (Ser expulso do recinto.)

Redução ao absurdo: É um raciocínio levado indevidamente ao extremo. Ou seja, quem faz uso dessa falácia parte do princípio de que um evento qualquer vai necessariamente levar a outro sem qualquer possibilidade de gradação ou razão aparente, como numa bola de neve montanha abaixo. É uma mistura de generalização apressada com um determinismo pessimista, pois só reconhece uma cadeia de eventos possíveis a partir de um fato. Exemplos:

"Se eu fizer uma exceção para você vou ter de fazer para todo o mundo."
"Se você cumprimentar aquele seu amigo que abandonou nossa igreja, ele vai encher sua cabeça de mentiras, você vai perder a fé e vamos ter de tratar você como um traidor também."

ENCONTRANDO FALÁCIAS NAS PUBLICAÇÕES DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ

Tipo: Generalização apressada e Apelo à ignorância.

Falácia: "Quando a professora explica como funciona cada parte de nosso corpo, não tenho dúvida de que Deus existe. Cada membro do corpo cumpre sua função até nos mínimos detalhes, e tudo isso acontece sem percebermos. O corpo humano é realmente impressionante!"

Tipo: Supersimplificação e Generalização apressada.

Falácia: "Quando eu vejo um prédio bem alto, um navio de cruzeiro ou um carro, eu me pergunto: ‘Quem construiu?’ Para que um carro ande, todas as peças dentro dele precisam funcionar corretamente. Alguém inteligente precisou fazer isso. E se os carros foram projetados por alguém, quanto mais nós, humanos."

Tipo: Apelo à ignorância, subjetividade.

Falácia: "Quanto mais eu estudava Ciências, menos a evolução fazia sentido. Por exemplo, eu pensava na precisão matemática da natureza, e em como os humanos são os únicos que têm a necessidade de saber quem são, de onde vêm e para onde vão. A evolução tenta explicar tudo em termos biológicos, mas nunca conseguiu explicar por que os humanos são únicos. Para mim, acreditar na evolução exige mais ‘fé’ do que acreditar em um Criador."

Tipo: Apelo à multidão e apelo à autoridade.

Falácia: "Você não está sozinho; muita gente acredita em Deus. E isso inclui profissionais extremamente inteligentes. Por exemplo, há cientistas que acreditam na existência de Deus."

Tipo: Inversão do ônus da prova, egocentrismo ideológico, apelo à ignorância.

Falácia: Os humanos têm uma “necessidade espiritual”. (Mateus 5:3) Isso inclui ter a necessidade de acreditar em Deus. Se uma pessoa diz que Deus não existe, é ela, e não você, quem precisa explicar como chegou a essa conclusão.

Tipo: Apelo à ignorância, egocentrismo ideológico.

Falácia: "Acreditar em Deus faz todo o sentido. Já foi provado que a vida não pode surgir do nada. Não existe evidência de que a vida tenha surgido espontaneamente a partir de matéria sem vida."

Tipo: Apelo à autoridade.

Falácia: "Cientistas famosos, como Galileu e Isaac Newton, acreditavam num Criador, e isso nunca foi um obstáculo ao amor deles pela ciência. Alguns cientistas da atualidade também não veem conflito entre a ciência e a crença na criação."

Tipo: Generalização apressada e supersimplificação.

Falácia:

  • Tudo o que Gênesis 1:1 diz é: “No princípio Deus criou os céus e a terra.” Isso não contradiz as evidências científicas de que a Terra existe há bilhões de anos.

  • O livro de Gênesis também usa a palavra “dia” para se referir a longos períodos de tempo. Por exemplo, em Gênesis 2:4, a palavra “dia” é usada para descrever os seis dias criativos juntos.

Conclusão: O relato bíblico da criação está de acordo com fatos científicos.

Tipo: Supersimplificação, generalização apressada e comparação tendenciosa.

Falácia: "Você sabe por experiência que, onde há um projeto, há também um projetista. Quando você vê uma câmera, um avião ou uma casa, logo conclui, e com razão, que alguém projetou essas coisas. Por que seria diferente quando se trata do olho humano, de um pássaro voando ou de nosso planeta, a Terra?"

Tipo: Redução ao absurdo, incoerência.

Falácia: "Os organismos vivos são complexos demais para terem se desenvolvido a partir de eventos não planejados e acidentais."

"É loucura achar que coisas tão lindas como uma borboleta ou um beija-flor simplesmente surgiram por acaso."

 (Partindo dessa linha de raciocínio, uma inversão de papéis teria que ser aceita: "Deus é muito poderoso, sábio, justo e amável para não ter tido princípio e não ter sido criado por um ser superior." E assim se cairia num infindável "loop".)

Tipo: Apelo à ignorância, generalização apressada.

Falácia: "Todas as formas de vida não vieram de um ancestral em comum. Os fósseis encontrados até agora provam que os grupos principais de animais surgiram de repente e não de forma gradual."

CONCLUSÃO

As falácias acima foram expostas para que seja observado que mesmo argumentos aparentemente sólidos podem estar recheados de falácias. Isso obviamente não prova que as crenças defendidas pelas Testemunhas de Jeová estão erradas, mas, por outro lado, mostra o perigo de não se atentar a falácias.

Fontes:

http://ateus.net/artigos/ceticismo/falacias-e-erros-de-raciocinio/

https://www.jw.org/pt/ensinos-biblicos/familia/adolescentes/perguntam/criacao-evolucao-parte-1/

https://www.jw.org/pt/ensinos-biblicos/familia/adolescentes/perguntam/criacao-evolucao-parte-3/

Comentários


contato@observatoriojw.org
@2016-2018 OBSERVATÓRIO DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ